sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Inimigo oculto

É natal. É fácil ver o riso estampando o rosto, neste período em que as alegrias se multiplicam, em que se percebe uma maior predisposição das pessoas em se doarem, em compartilharem sua vida e seus momentos. É um período de reuniões familiares e de confraternização entre amigos. Mas também é um tempo em que costumamos nos reunir conosco mesmos, em que sopesamos as idas e vindas, revemos os projetos e contrabalançamos as conquistas. O resultado dessa autoavaliação, desse mergulho em nosso próprio íntimo, entretanto, nem sempre reveste-se de conclusões positivas, nos levando, não raro, à insatisfação, à tristeza e à melancolia.

É nesse contexto que o período natalino, sinônimo de festa e alegria, converte-se, para muitos, em momentos de solidão e agonia, angústia torturante, aflição intensa. É o que os especialistas tem diagnosticado como “depressão natalina”, que implica num agravamento da depressão em indivíduos já acometidos ou no acometimento do distúrbio de forma temporária em indivíduos sãos.

A causa estaria nas lembranças que esse período provoca, na falta de alguém, na falta de realizações, e, em muitos casos a tristeza costuma ir embora assim que as festas se vão. Em outros casos, o natal só vem agravar a sensação de desânimo, a melancolia e a falta de autoestima que torna todas as coisas difíceis e sem graça o ano inteiro. Outro aspecto seria a solidão e o fechamento em nós mesmos. Sem a referência dos outros, somos tendentes a achar que estamos sós e que nossa situação é a pior de todas.

As indicações de ajuda pelos especialistas são variadas, indo desde a prática de exercícios físicos, que atuariam junto aos neurotransmissores, aumentando a disposição física e mental, à prática de tratamentos alternativos com massagens de todos os tipos, especialmente as relaxantes, com a explicação de que, ao sentir o corpo, o indivíduo ganha nova disposição e vontade de viver.

Todas as indicações são consideráveis e respeitáveis, oriundas dos mais notáveis especialistas no assunto. Aliada a elas, há uma providência da qual não nos devemos olvidar se quisermos estar à margem de qualquer problemática dessa natureza, a qual consiste na assunção completa de nossa natureza humana e de que, como humanos que somos, não podemos abdicar de nossa condição de falíveis, de seres absolutamente frágeis, dependentes uns dos outros e deixarmos de nos cobrarmos exageradamente, de nos compararmos com os outros, de pretendermos os padrões dos outros e de nos depreciarmos por não alcançá-los.

A sensação do insucesso, o descontentamento, o sentimento de autocomiseração são conhecidas causas de depressão. E elas decorrem, nos mais das vezes, dos objetivos astronômicos que traçamos para nossa vida sem termos base de sustentação sólida para alcançá-los. Nada impede que tracemos tais metas, mas que se as almeje galgar passo a passo, com os pés no chão, conscientes de nossa realidade e não com sustentação na sonhada realidade alheia.

Se traçarmos metas factíveis e nos desdobrarmos na utilização de todos os mecanismos lícitos para alcançá-las, por certo o que aflorará em nós será a satisfação decorrente do sucesso ou a consciente constatação do insucesso, apaziguada pela certeza de que esse resultado não decorreu de falta de atitude ou de desídia.

Para quem se aceita como humano e tem consciência dessa condição, entregar-se na busca de uma realização e falhar não é causa de depressão, mas de persistência, de mudança de estratégia e de reconhecimento de que há limites para a ingerência humana, os quais decorrem das mais diversas circunstâncias, muitas vezes de tempo e oportunidade.

De outra banda, precisamos aprender a valorizar mais as nossas conquistas que os insucessos; dar mais valor ao que temos do que ao que gostaríamos de ter; buscarmos a realização dos sonhos com os pés fincados na realidade.

Então, que possamos vivenciar o período natalino de forma plena, desligados de vivências tristes do passado e de frustrações quaisquer que possam nos afastar da realidade em que mais um presente nos é oferecido – mais um ano que se inicia trazendo consigo muitas alegrias e oportunidades, inclusive de renovação, sob todos os aspectos.

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