domingo, 6 de dezembro de 2009

Tudo está perdido?

Uma multidão seguindo sem saber pra onde, cada um por si, todos querendo chegar em primeiro lugar. Guerra de cotovelos, de egos, de vaidades e de necessidades. Como armas, a inteligência voraz, a astúcia, a manha, a salércia, a artimanha, a barganha.

Jaz o tempo em que pregávamos a liberdade como o caminho da vida. Hoje, se de um lado nos sentimos menos tolhidos, se podemos livremente ir e vir e nos expressar abertamente, estamos cada vez mais escravizados pela ganância, pela cobiça, pelo orgulho e, em consequência, cada vez mais sós conosco mesmos, escravos da solidão, da desconfiança, do medo de partilhar, do temor de nos mostrarmos, de sermos solidários.

Vivemos sob o jugo da concorrência, da competição, da vitória a qualquer preço, nos mais variados aspectos da vida humana. Assim é que o cotidiano nos põe permanentemente num ringue, numa luta interminável por sermos ou, ao menos, parecermos o mais preparado, o mais bonito, o mais inteligente, o melhor remunerado, o mais forte... Vivemos numa época que nos impõe nada menos que ser um super homem, uma mulher maravilha pra que nos sintamos aceitos e admirados. Em qualquer área de atividade humana, o sucesso é o termômetro para a aceitação e o reconhecimento, levando-nos à bancarrota, à sensação de verdadeira abjeção qualquer indicação ou possibilidade de fracasso.

Há muito desviamo-nos do caminho em cujo destino almejávamos tão somente a liberdade como bem maior, capaz de nos assegurar a sensação de bem estar permanente, tão comumente elevada à categoria de felicidade. Por ela muito se disse e se fez nos idos das décadas que lograram viver a juventude dos nossos avós.

Mudamos o tom. Mudamos o discurso. Mudamos a meta.

Deixamos que a cobiça nos envenenasse a alma. Levantamos a muralha do ódio. Revertemos nosso olhar pra dentro de nós mesmos e esquecemos do outro. Caminhamos a passos cada vez mais largos na busca de objetivos pessoais e nem olhamos mais para o lado, onde nossas atitudes, ou a falta delas, incentivam a injustiça, a miséria, a corrupção e os morticínios.

Estamos enclausurados numa época de produção veloz que nós próprios criamos. Transformamo-nos em máquinas de produção em grande escala e, com isso, provocamos escassez. Escassez de atenção, de fraternidade, de valorização do humano enquanto simples humano.

De tanto que conhecemos e nos é dado a conhecer tornamo-nos céticos; nossa inteligência nos tornou cruéis, empedernidos, indiferentes à situação do outro.

Aprimoramos nossos pensamentos, mas petrificamos nossos sentimentos.

Mais do que nos transformar em máquinas, nossa inteligência precisa nos volver ao que há de mais humano em nós; mais do que o intelecto, precisamos desenvolver nossa capacidade de afeição, de doçura. Que possamos criar robôs sem nos robotizarmos, sem perdermos a sensibilidade que nos caracteriza como seres humanos.

Se aprimorarmos essas virtudes por certo a vida nos será menos violenta, mais equânime e, ao final do caminho, o futuro nos levará a concluir que hoje estamos errados quando bradamos aos quatro cantos que não “há mais jeito”, que “tudo está perdido - meu Deus!”.

Nenhum comentário: